Todas as noites, Rita penteava os cabelos
E para não desfazê-los,
Dormia sem se mexer.
Ah, que cuidado ela tinha com os cachos
Que atraiam os machos
Que a observavam viver.
Rita também cantava como um sabiá,
Fazia a cidade a parar
Ao entoar uma melodia.
Ah, como era doce a donzela dos olhos castanhos,
Causando desejos estranhos
Toda vez que sorria.
Eu, que sempre a observava da janela
E não queria outra além dela
Tenho a missão maldita
De contar em prosa e verso
Como o destino perverso
Deu fim à doce Rita.
Foi numa tarde de domingo
Sua mãe jogava bingo
E seu pai estava no bar.
Sentiu uma dor tão intensa
Mas não sabia a sentença
Que o médico iria lhe dar.
Seu corpo foi tomado pela célula reprodutora
E a garota sonhadora
Sucumbiu ao tratamento
Foi-se embora o seu canto, seu cabelo e seu sorriso
E o famoso paraíso
Transformou-se em sofrimento.
Sozinha, sem amigos, sem machões e sem família
Transformou-se numa ilha
Até que eu a visitei.
Sempre desejei a garota da janela
Mas foi pela garota magrela
Que realmente me apaixonei.
Todos os dias a visitava, com flores nas mãos
E esperaria sua recuperação
Nem que durasse cem anos.
Assim, o tempo passou sem dilema
E como no cinema
Enfim, nos beijamos.
Foi a última vez que a vi
Olhei em seus olhos e parti
Em uma hora, soube de sua passagem.
E mesmo em meio às dores
Não esqueceu das minhas flores
E me deixou uma mensagem.
“Você que corria para a janela
E via passar a donzela
Não chores, sejas forte.
Pois um amor construído
Com um dos amantes ferido,
Não acaba com a morte.”
De sua mãe, recebi suas anotações
Li todas as recordações
De tudo que fiz por ela.
Mas a vida é uma piada
Pois ela sempre foi apaixonada
Pelo garoto da janela.